terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Poesia: Senhor Palomar

wisdon | Crianças olhando a paisagem Ítalo Calvino
Mas como é possível observar alguma coisa deixando à parte o eu?
De quem são os olhos que olham?

Em geral se pensa que o eu é algo que nos está saliente
dos olhos como o balcão de uma janela e contempla o mundo
que se estende em toda a sua vastidão diante dele.

Logo: há uma janela que se debruça sobre o mundo.
Do outro lado de lá está o mundo; mas e do lado de cá?
Também o mundo: que outra coisa queríamos que fosse

Com um pequeno esforço de concentração,
Palomar consegue deslocar o mundo dali de frente e colocá-lo debruçado no balcão.
 Então, fora da janela, que resta?

Também lá está o mundo, que para tanto se duplicou em mundo que observa e mundo que é observado.
 E ele, também chamado “eu”, ou seja, o senhor Palomar?
Não será também ele uma parte do mundo que está olhando a outra parte do mundo?

Ou antes, dado que há um mundo do lado de cá e um mundo do lado de lá da janela, talvez o eu não seja mais que a própria janela através da qual o mundo contempla o mundo.

Para contemplar-se a si mesmo o mundo tem necessidade dos olhos (e dos óculos) do senhor Palomar.

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